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Por: Bruna Cabral - Jornal do Comércio
Quanto tempo você fica conectado à Internet? O que lhe prende à Rede? Apesar de ter gente que exagera, especialistas garantem que ser ‘viciado’ na Internet não oferece mais perigo
Navegar é preciso, viver não é preciso. A frase de Fernando Pessoa, que bem poderia ter sido adotada como lema de vida por milhares de internautas em meados da década de 90, quando a Web chegou ao País, já não faz tanto sentido assim para muitos cibernavegantes. E a tendência é que faça cada vez menos. Uma corrente crescente de psicólogos prevê o desaparecimento gradativo de um fenômeno que já causou discussões calorosas e chegou a ser considerado um grande mal da pós-modernidade: o ‘vício’ em Internet.
Para esses especialistas no comportamento humano on e offline, o uso ‘patológico’ da Rede e de todas as suas ferramentas deverá deixar de existir quando as novas tecnologias estiverem mais difundidas e boa parte da população mundial, conectada. "Quando a maioria das pessoas tiver e fizer uso efetivo de computadores com acesso à Rede, a Internet vai virar uma tecnologia invisível, como o telefone", diz o professor de Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco Luciano Meira.
Além de desenvolver pesquisas sobre a relação entre bits, bytes e psiquê humana, ele tem outras ligações com o tema. A começar pelo sobrenome. É irmão de um dos maiores nomes da Tecnologia da Informação do Estado, Silvio Meira. Além de ser, ele próprio, um usuário assíduo da Web. E, como irmão de guru também tem seus poderes, o psicólogo se arrisca a prever que esse processo levará décadas.
A julgar pelo ritmo em que a inclusão digital cresce no País, é bem provável que sua previsão se concretize. Mas as mudanças já começaram. A evolução da Internet está fazendo com que o conceito de vício seja revisto e discutido. "Essa sempre foi uma questão polêmica. Não porque a compulsão por Internet seja mais difícil de diagnosticar que as demais, e sim porque é recente e ainda não foi estudada o bastante para ser compreendida", diz Meira.
Segundo ele, não há, por exemplo, um conjunto de critérios aceitos pela comunidade científica internacional para diagnosticar o vício em Internet. "Fatores como o tempo de navegação, que antes eram relevantes, hoje não contribuem tanto para definir quem tem ou não problemas. "Isso porque, atualmente, todos os internautas passam mais tempo online que há alguns anos. Palavra do Ibope eRatings!
O analista de sistemas Kleber Malaquias, 27, já esteve ‘preso’ na Rede. No começo da Internet, trocava futebol, saída com amigos, cinema, qualquer coisa pelo computador. Virava três noites por semana em salas de bate-papo. "Até que conseguiu mudar. "Ocorreu naturalmente. Chegou uma hora em que vi que era exagero", lembra.
Vício em Web é conceito em desuso
Especialistas acreditam que euforia inicial com Internet é normal e que, com o tempo, o usuário lida normalmente com a nova tecnologia. Não há motivo para preocupação
Levantamentos feitos pelo Ibope eRatings mostram que a média de horas navegadas da população brasileira está crescendo. Era de sete horas em janeiro de 2001 e, em abril, subiu para 11h26. No mesmo mês, a população de países bem mais ‘hi-tech’, como Estados Unidos, Japão e Hong Kong, navegou 12, 13 e 22 horas, respectivamente.
E não poderia ser diferente, na avaliação dos psicólogos. Segundo eles, o uso está mais intenso, porque a Rede oferece cada vez mais serviços, como Internet banking e e-commerce. E isso relativiza o conceito de ‘vício’. "Todos nós viramos dependentes de Internet, como somos da energia elétrica, por exemplo", defende o psicólogo Oliver Zancul Prado, que fez uma pesquisa sobre o tema em 98. Segundo ele, estar plugado não é mais uma questão só de desejo, tem a ver com necessidade. "A estrutura social que assumimos nos induz a estar conectados, isso não é um mau sinal", diz.
A-pai-xo-na-dos por computador, os irmãos Igor e Giovanna Rodrigues não conseguem passar um dia sem navegar. Com um PC cada (medida adotada pelo pai para evitar brigas), eles passam o dia online.
Giovanna, 22 anos e estudante de Direito, só passou um dia inteiro offline quando tinha 17 anos e foi à praia por duas semanas. "Morri de saudade. Quando voltei, quase chorei de emoção ao ver meu micro", lembra.
A rotina do irmão Igor, 23, só muda por um aspecto: ele é programador de sistemas, ou seja, está plugado também por necessidade. Assim como o pai dos meninos, que tem um notebook e faz pesquisas constantes na Rede. "Pedimos comida, compramos CDs, consultamos horário de cinema e tudo que for possível", diz Igor. Segundo ele, a Internet é o mascote da casa e os PCs, integrantes da família.
Estar online não significa depender de Internet
Diz por onde andas no ciberespaço, que os psicólogos dirão se viciado és. Isso porque, garantem, a forma é um fator tão importante quanto a intensidade para investigar o uso que cada um faz da Rede. Afinal, uma coisa é passar quatro horas jogando ou num chat e outra é distribuir esse tempo em várias atividades, como Internet Banking, pesquisas, e (por que não?) um bate-papo aqui e acolá.
Ou fazer tudo isso no meio do expediente, como já virou rotina para o estudante de Informática Renato Malta, 21 anos, e para o ‘helpdesker’ Marcelo Andrade, 28. Para eles, passar o dia inteiro online significa ossos do ofício. "Presto consultoria online sobre segurança e configuração de redes e tenho que estar sempre à disposição para uma emergência", diz Malta. Já Marcelo Andrade socorre os clientes da empresa em que trabalha. Mas a verdade é que nenhum dos dois dispensa uma navegada após o expediente, nem esconde o prazer em navegar" meio compulsivo, admitem.
"Se passar muito tempo longe do computador, fico ansioso, querendo saber quantos e-mails recebi, o que está acontecendo no ciberespaço", diz Marcelo. Com Renato, que dedica 12 horas diárias a atividades ‘digitais’, não é diferente. Se ele acha ruim? "De jeito nenhum! Afinal, 90% do que sei hoje aprendi navegando."
Mais que parecida, a história dos dois se cruza: eles se conheceram no ciberespaço quando os chats estavam no auge no Brasil e os dois, escravizados pelo PC. "Deixava tudo de lado para ficar no micro", lembra Marcelo. Mas isso foi mudando. "Vieram as responsabilidades, o trabalho, a esposa, aí você esquece um pouco."
São casos como esses que levam psicólogos a questionar se o ‘vício’ em Internet é mesmo uma patologia. "Quando começa a navegar, o usuário fica encantado e tende a perder o controle. Com o tempo, a tendência é diminuir o ritmo", diz Márcia Homem de Mello, que tem formação em psicologia e psicodrama e se dedica a todas as aplicações online das duas ciências. "Os únicos danos que isso pode causar são físicos: problemas de coluna ou coisas do tipo. Ninguém perde o emprego por ficar tempo demais online se realmente precisar do dinheiro", diz.
Segundo ela, esse ciclo de utilização que se observa na vida dos usuários está sendo reproduzido na sociedade em geral. "Antes se falava muito em viciados em Internet, porque era algo novo. Hoje, fala-se bem menos e no futuro isso vai deixar de existir", prevê.
Meira tem um palpite menos ‘otimista’. Para ele, sempre haverá usuários que ‘sucumbirão’ à Rede. "Os jogos de azar existem há milhares de anos e ainda tem gente que se vicia neles, como no trabalho ou na comida. "Mas a tendência, contemporiza, é que o problema assuma dimensões menores.
Só não pode haver isolamento online
Se o vício será extinto com a disseminação da Internet, nenhum psicólogo pode dizer. Mas eles garantem: após quase 10 anos de Internet no Brasil, o mal ainda faz vítimas. Diagnosticá-lo não é trabalho dos mais fáceis. Afinal, além da resistência natural dos ‘compulsivos’, os psicólogos têm outro entrave: a falta de pesquisas sobre o assunto.
No Brasil, um dos poucos grupos que estudam os efeitos da Internet e das novas tecnologias é o Núcleo de Pesquisa de Psicologia e Informática (NPPI) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), que presta serviços de orientação a internautas do País e do mundo. "Nos últimos três anos, recebemos mais de quatro mil e-mails", conta a coordenadora do grupo, Rosa Maria Farah.
O número de ‘pedidos de socorro’ de ‘viciados’ ("ou de parentes ou amigos deles, o que é mais comum") está diminuindo, embora a procura pelo NPPI venha crescendo. "Só em 2002, foram 2,7 mil mensagens recebidas", diz. "Apenas três ou quatro tratando do problema por semestre."
A explicação? "Talvez o usuário ‘patológico’ seja muito resistente a se reconhecer como tal ou a buscar ajuda, talvez sejam menos numerosos do que se supõe, ou o problema siga uma curva: surge, tem um pico e reflui com o aprendizado do uso mais saudável e criativo."
Nem por isso a psicóloga acredita que o problema deva ser negligenciado pela comunidade científica. "Com base nos e-mails que recebemos, definimos alguns critérios para caracterizar os internautas que fazem uso patológico da Rede", conta. Entre eles estão a preocupação constante quando se está offline, irritabilidade ao tentar reduzir o tempo de navegação, necessidade de esconder o grau de envolvimento com a Internet, comprometimento social ou profissional e falta de interesse em atividades offline.
Este último, segundo o também pesquisador da área Luciano Meira, é o mais grave. "Um dos poucos sintomas de uso patológico reconhecido e considerado por pesquisadores de todo o mundo atualmente é a cisão entre vida online e offline. "Isso ocorre quando o usuário deixa de estabelecer uma relação entre as atividades virtuais e sua vida cotidiana.
TUDO PELA REDE "Para a estudante Rita Jatobá, 28, estar em casa é sinônimo de estar conectada. Ela já tentou reduzir o tempo online muitas vezes, por pressão da mãe, quando ainda não tinha acesso dedicado. Mas fracassou. Apesar dos percalços, Rita não se sente lesada pela Rede. "A Web já me trouxe muitas coisas positivas, amigos, conhecimento e agilidade de raciocínio. "Mas esse é outro sintoma do ‘vício’: não reconhecer seus efeitos nocivos.
Outro sintoma que os próprios internautas acrescentariam à lista dos pesquisadores é ter um blog. "Vicia, você precisa ficar atualizando e fica pulando de um pro outro", diz a designer Cecília Torres, 23, ‘blogueira’ de carteirinha.
Veja alguns sites que tratam do ‘vício’ em Internet:
vIRCio - Trocadilho com as palavras vício e IRC. Seu fundador, Rafael Fijalkowski, queria estudar o próprio apego ao ciberespaço e encontrou pouco material. Daí surgiu o site, em 2000, com apoio de psicólogos como Oliver Zancul Prado. Fijalkowski, que já se considerou um viciado em Internet, hoje passa a maior parte do tempo online administrando o site.
Núcleo de Pesquisa de Psicologia e Informática (NPPI), da PUC-SP - Serviço de orientação sobre qualquer assunto relacionado à psicologia versus tecnologia. Tem também dados sobre o trabalho do núcleo.
PsicoInfo - Disponibiliza pesquisas e salas de bate-papo, além de orientação aos interessados.
Net Addiction - Site internacional em que é feito até atendimento psicológico aos internautas, já que não há impedimentos legais com relação a essa prática nos Estados Unidos.