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Brasil, o país em que o psicodrama deu certo 
Técnica terapêutica criada em Viena tem mais de 5 mil especialistas aqui

 

O Estado de São Paulo 
Domingo, 10 de fevereiro de 2002 
ROLDÃO ARRUDA
  
No Brasil existem cerca de 5 mil profissionais trabalhando como psicodramatistas, segundo estimativas da Federação Brasileira de Psicodrama (Febrap). Não se sabe de outro país do mundo onde esse movimento psicoterapêutico tenha adquirido tanto prestígio. E tudo indica que a fase de ascensão não terminou. 
Neste ano o programa Comunidade Solidária, coordenado pela socióloga Ruth Cardoso, vai utilizar o psicodrama com adolescentes de comunidades pobres do Nordeste para disseminar noções de sexo seguro, e prevenir a aids e gravidez precoce. No Estado de São Paulo, o governo usa a técnica para treinar ouvidores públicos, funcionários da Receita e de outras áreas administrativas. A psicóloga e prefeita Marta Suplicy também é uma entusiasta. 
Um dos primeiros atos de visibilidade de seu governo, em março do ano passado, foi a realização de 98 sessões em lugares públicos, nos quais moradores representaram e discutiram dramas sociais - os chamados sociodramas. Atualmente até moradores de rua são atendidos pela assistência social com a mesma técnica. 
Também há ONGs, escolas, instituições comunitárias e empresas usando o psicodrama. Além, é claro, das pessoas que se reúnem por conta própria nos consultórios e clínicas para analisar em grupo os seus problemas. 
Na TV - Nesse conjunto, vale destacar a iniciativa de um grupo da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), que tenta levar o psicodrama para a televisão. O nome seria telepsicodrama. Em associação com especialistas em comunicação, da Faculdade Cásper Líbero, o pessoal da USP está produzindo um programa-piloto de educação sexual. 
Segundo a coordenadora do projeto, a professora Heloísa Penteado, da pós-graduação da Faculdade de Educação, pretende-se exibir o programa numa primeira fase para professores e alunos de escolas da rede pública. Na etapa seguinte deve chegar a um público maior, nas TVs educativas. "Há mais de 20 anos utilizo esse método na área pedagógica e acredito na sua eficácia", diz Heloísa. 
Já foram gravadas várias sessões com um grupo de adolescentes da Escola de Aplicação. Seguindo a técnica da psicoterapia, são eles os autores e os intérpretes do texto, que surge ali mesmo na sessão do grupo. Atuam sob a direção do psiquiatra Ronaldo Pamplona - responsável pela área de psicodrama do projeto. Neste momento o material está sendo editado. 
Pamplona, que desde a década de 80 faz pesquisas sobre telepsicodrama, tem a sensação de estar dando forma a um dos sonhos do médico romeno Jacob Levi Moreno. Ele se refere ao pai do psicodrama - método que ganhou forma quando ele trabalhava em Viena, no início do século passado. 
Proposta - Num artigo que integra o recém-editado livro Um Homem à Frente de Seu Tempo, Pamplona afirma que o sonho de Moreno era "quebrar as paredes dos consultórios onde se acha confinado o psicodrama e atingir a 'realidade social', como dizia." 
Moreno morreu em 1974, nos Estados Unidos, imaginando sessões transmitidas por redes de TV. O Brasil pode ser o primeiro país do mundo a dar forma a essa nova versão do seu método de trabalho. Mas por qual motivo a criação do médico romeno, inicialmente desacreditada pela psiquiatria tradicional e até hoje desdenhada por alguns círculos, ganhou tanto prestígio no Brasil? 
Popularidade - Há várias explicações. O psiquiatra Antonio Carlos Cesarino, um dos mais respeitados psicodramatistas do País, lembra que o método começou a expandir-se no Brasil na década de 70, em plena ditadura militar. Os sociodramas, com vocação política, eram uma espécie de contra-corrente à censura, à repressão, conforme explicações do psiquiatra em outro artigo de Um Homem à Frente de Seu Tempo. Isso teria contribuído para sua expansão. 
Outro especialista, Luiz Amadeo Bragante, psicodramatista há 28 anos, acredita que a explicação está no cemitério onde foi enterrado Romero, na cidade de Beacon, próxima a Nova York. Sobre seu túmulo escreveram: "Aqui jaz o homem que veio trazer alegria à psiquiatria." 
Bragante explica que o método desenvolvido para trabalhar com grupos, em consultórios ou ambientes abertos, baseia-se na espontaneidade, na criatividade e na saúde. "É mais leve, mais criativo, mais solto e menos ortodoxo que os outros métodos", diz. "Combina com os brasileiros." 
Para a presidente da Febrap, Heloísa Fleury, a criação dessa entidade, 25 anos atrás, também ajudou na organização e fiscalização da formação dos profissionais, incentivado o debate científico e unidade dos profissionais. 
Hoje a Febrap agrega 45 associações espalhadas por todo o País. Um congresso de psicodrama, que ocorrerá em maio, deverá contar com mais de mil participantes. 

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