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Me sinto Sufocada
Márcia Homem de Mello©

"Estou sentado nas costas de um homem, sufocando esse homem, 
obrigando-o a me levar pra lá e pra cá, a me transportar. 
Ao mesmo tempo, tento me convencer (e aos que me olham) de que 
estou com uma certa compaixão por ele e 
manifesto o desejo de melhorar o seu destino de qualquer forma possível. 
Compaixão sim, mas sem sair de cima de suas costas." Leon Tolstoi

Essa semana um tema veio até mim várias vezes e por vias diferentes. Mas citavam homens que sufocam suas parceiras. Engraçado, que esse era um discurso masculino! Estaríamos numa inversão de papéis?
Na minha reflexão, lembrei de um texto que já escrevi, o “Reflexão sobre o Sentimento de Posse” pois me pareceu algo muito relacionado com o termo sufocamento. 

 

No dicionário significado de Sufocar diz:
v.t. Fazer perder a respiração; fazer morrer por asfixia.
Tornar a respiração difícil: calor que sufoca.
Reprimir: sufocar os soluços.
Impedir de divulgar-se ou de desenvolver-se: sufocar um escândalo, uma revolta.
V.i. Respirar com dificuldade: sufoca-se aqui.
Sufocar de tanto rir, rir a ponto de quase não poder respirar.

 

Reprimir, impedir de desenvolver-se, sufocar uma revolta... Será que uma pessoa tem esse direito sobre o outro? Será que eu posso cobrar do outro meus próprios sentimentos de insegurança e carência?
Claro que a resposta é não. Mas muitos se acham com esse direito, sem se dar conta de que a “relação esta subindo no telhado”, vestem a máscara de bonzinhos, fazendo tudo em nome do bem estar do “outro”. Querer proteger, cuidar, dar presentes em nome dessa proteção, que no fundo se torna uma arma para chantagear e manter o outro nessa bolha de sufocamento. É a cobrança pelos “bons gestos” prestados. 
E a teia vai crescendo, o outro achando o máximo no começo ter alguém que cuide, que dê atenção, que proteja, aos poucos começa a perder sua própria identidade, pois substitui pelos sonhos, projetos e decisões do outro. 
O Sufocador, continua a não se dar conta do prejuízo que causa a si mesmo, pois acabará ficando só, seu ego não permite ver que o mundo não gira em torno do seu umbigo. Muito menos percebe o tamanho de sua insegurança disfarçada em autoritarismo, imposição e agressividade a cada vontade do outro de criar asas, de ter um sonho ou espaço individual. 
Encontrei em um fórum o claro exemplo do sufocador em ação: 

 

"Mulheres me ajudem, como faço para não sufocar a minha namorada? Como fazer ela sentir a minha falta?
Gente, gosto de ligar toda hora, de passar mensagens, de dengar, de falar que a amo muito toda vez que ligo, em fim, passo para ela toda hora segurança e tem algumas vezes que eu não sou correspondido do jeito que eu espero, como fazer para ela sentir a minha falta e fazer tudo que eu faço pra ela?"

 

Observem que ao mesmo tempo que há um pedido de ajuda para mudar, logo adiante ele faz a cobrança pelos “bons gestos” ao dizer que não é correspondido do jeito que espera, e quer de volta tudo que faz por ela. Quem faz algo para o outro esperando receber em troca, esta se relacionando de forma equivocada! Por que ao invés de fazer pelo outro esperando retribuição, não faz diretamente p sí mesmo? Então devo maltratar, ignorar ou desdenhar minha parceira? Não. Estamos falando em equilíbrio, em sensatez, em pensar em seus próprios sentimentos e saber que cada um é responsável por si mesmo. Em não ficar esperando que o outro seja responsável em dar-lhe algo que sente falta. 
Pensar que nunca será traído é um bom motivo que o sufocador também encontrou para pensar que consegue controlar o mundo do seu relacionamento. Ligar insistentemente, mandar mensagens, disponibilizar alguém para controlar em seu lugar, conversar com parentes, amigos, vigiar Orkut, MSN, email, Twitter, Celular... É mesmo uma forma de cuidar? O sufocador vestiu uma armadura falsa para que nada atinja quem cuida, nada o atinja, mal sabendo que seu pior inimigo esta dentro da propria armadura. Como disse bem Rosana Braga: 

 

“Porque a ilusão de que o parceiro deva ficar sob nossa supervisão nos dá a sensação equivocada de segurança... mas enquanto tentamos vigiá-lo, perdemos também a nós mesmos, desviamo-nos de nosso próprio caminho para seguir um caminho que não existe, que não é o nosso e também não é o da pessoa amada” E ainda mais “Porque definitivamente, pressões e cobranças não são garantia de fidelidade. Nunca foram, mas actualmente, atitudes como estas parecem estar garantindo bem mais o exacto oposto, ou seja, que haja menos tolerância e disponibilidade para fazer dar certo, que a relação acabe mais rapidamente ou que sobreviva permanentemente doente...
Infelizmente, muitas vezes nos damos conta do quanto estávamos perdidos dentro de um relacionamento e o quanto estávamos transferindo nossas neuroses e inseguranças somente quando perdemos um grande amor!”

 

Precisa acrescentar mais alguma coisa depois disso? Quer ver outro exemplo de sufocamento pelo lado do sufocado: Veja: 
“O que fazer com homem grudento? Não o aguento mais. Ficamos no Carnaval (logo, o que acontece no Carnaval fica no Carnaval) e desde então ele vem me sufocando cada dia mais. Não serve nem pra esnobar um pouquinho, nem para tentar uma conquista diferente, uma canalhisse mesmo, mas não, fica nisso de poemas e do "Eu preciso de você Bruna!". 
Tento mostrar que ele não pode precisar de ninguém mas ele não me escuta, não quero destratar pois sei que ele teve traumas de infância não superados, enfim já cheguei ao ápice. Desde fevereiro, ele vem com toda a sua melancolia (que é muita) me sufocar. Ele até se declara amante de Alvares de Azevedo e as vezes eu realmente tenho medo dele. Já o chamei de doentio mas mesmo assim ele continua nisso. Tenho medo que me sequestre sei lá. Teve um mês que ele me mandou mensagem no celular todas as noites. Já tentei dar uma chance mas só de pensar que vou me encontrar com aquele grudento, já broxo.” Retirado do site: Malvadas 
E geralmente o sufocador não escuta mesmo. Persiste na idéia fantasiosa de que faz o bem, e o malvado é quem quer dizer que ele não esta correto. Criam uma defesa para suas próprias emoções doentias, que as vezes não conseguem nem acordar, vira a doença da POSSESSIVIDADE. Pior quando entram na fase dos presentinhos e estar sempre disponível quando a parceira precisar. Ligue o sinal de alerta sufocada, você pode estar mesmo em perigo!
Para fechar esse texto dois trechos do livro “Velejando com a Vida”:

 

- "Quando aperto o nó, vejo amantes unidos, braços e pernas entrelaçados, pernas estendidas. Quando afrouxo o nó, vejo os amantes se separando, como deve ser, porque os que se amam, ainda que se amem muito, não podem estar ligados pelo amor em todos os momentos de suas vidas. 
Entretanto, o que mais acontece quando um homem e uma mulher se encontram não é atarem o nó direito, e sim o nó torto, e tornarem-se prisioneiros do amor, e não parceiros, consortes. Esfolam-se e desgastam-se com o atrito e, mesmo que lutem e se esforcem, não conseguem escapar de seus laços. "Estamos amarrados", dizem quando caminham para o altar, e suas palavras são mais proféticas do que imaginam. Uma vez casados, marcham em formação cerrada no mesmo ritmo, com o mesmo passo travado, aos arrancos. É uma situação lamentável, mas não há nada a fazer; como o nó que ataram não se afrouxa, eles se enredam de tal modo que afinal se estrangulam"
- "Acho que a maioria de nós tem medo de se entregar e sentir tristeza pelo que a vida levou, porque pensa que nunca mais vai recuperar o domínio de si. O medo é infundado; o que deveria realmente nos assustar é a possibilidade de perder a capacidade de lembrar a vida que vivemos, que nos conecta com nós mesmos. As doenças mais aterrorizantes não são as que nos tiram a vida - são as que nos deixam à deriva, ao sabor da corrente em um mar vazio, privando-nos de nossas lembranças."

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