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"Viciados em Internet"
Cuidado: navegar é muito bom, mas não deixe que seu lazer vire dependência
Por: Roberto Cassano (Revista Internet Br - Abril de 99)©

 

Existe um mundo onde não chove nem faz frio ou calor. Ou até chove, mas só se o dono assim o quiser e o programa permitir. É um mundo onde os sorriso são feitos de letras e o que somos pode ser sintetizado em um apelido. Um mundo fascinante, rico, cheio de pessoas e de histórias. Mas que não é outro mundo. Ele não pode (ou não deveria) substituir um outro lugar, mais antigo, chamado mundo real. 
A Internet é uma gigantesca mão de roda. Ela veio para encurtar as distâncias, democratizar o acesso à informação e uma penca de coisas boas, que estamos sempre destacando. Mas, para algumas pessoas, a rede assumiu um papel polêmico. Passou a ser o princípio e o fim do dia-a-dia de gente que não consegue imaginar a vida longe de um monitor e de um modem.
"Jamais conseguiria viver sem a Internet nos últimos tempos. Aqui é onde encontro soluções para todos os meus problemas e também é onde tenho a maior parte dos meus amigos que estão espalhados por esse mundo de meu Deus. Sinceramente eu, sem a Internet, não seria mais nada, perderia por completo a minha personalidade". O depoimento da internauta Adriana, sincero e assustador, foi uma resposta à questão "Você sobreviveria sem a Internet hoje em dia?", proposta no Fórum da Internet.Br. Por que isso acontece?
Freud Explica
A psicóloga Márcia Homem de Mello, do site Psy_Coterapeutas On Line, atribui esta paixão pela sede de conhecimento do Ser Humano, que pode ser saciada - e estimulada - pela Internet. "As pessoas podem conhecer e conversar com outras que elas nunca viram, sem pré-conceitos e sem preconceitos. É tudo estimulado, em parte, pela fantasia que cada um cria", conta.
Mas Márcia trata de retirar da Rede a alcunha de vilã: "Todos falam muito em vício da Internet, mas muita gente se esquece de que, se não existisse esse meio, os indivíduos que se tornaram viciados nele com certeza estariam procurando outra coisa para colocar no lugar".
Para muitas pessoas a timidez é o impulso para substituir o mundo real pelo virtual. "Acredito que a Internet me ajuda muito a expressar minha opinião; vejo que as pessoas se interessam por ela, muitas vezes. É bom para a auto estima, você é valorizado, mesmo que através de uma tela", conta Fabiana (nome fictício), internauta de Niterói, RJ, que fica cerca de quatro horas por dia ligada à Rede. Quatro horas é muito? "Como vou saber se eu sou viciado em Internet?", você pode estar se perguntando... Vamos falar mais sobre isso.
Quando o Hobby vira Vício?
Fabiana, que se considera uma fanática pela Rede, percebeu que estava se envolvendo demais com a Internet quando passou a ligar o computador e precisava conectar para encontrar alguém e não conseguia mais responder os e-mails sem estar conectado. E quando não se consegue um computador para acessar? Qual a sensação? "Ansiedade... Vontade de saber se alguém te escreveu, ou como estão seus amigos... é como se faltasse algo, nem que seja por dez minutos, mas preciso falar com os amigos, ler e-mails etc.", narra Fabiana.
A psicóloga Márcia de Mello explica que podemos considerar que o lazer foi longe demais quando se deixa de realizar compromissos por causa dele, quando não se contenta com a vida que tem, a não ser que o indivíduo esteja diante de um computador. E mais: " Quando, para tudo na vida, precisa-se passar antes pelo computador e quando se deixa de conhecer pessoas no real para só encontrá-las pela Internet".
Realmente, todo esse papo de mundo real e virtual é muito confuso. Afinal, tudo é real. Ou não? Sérgio 9nome fictício), de Belo Horizonte, MG, está decidido a abandonar a Internet.
Aposentando a Rede
"Enquanto mergulhava cada vez mais no computador, meus amigos foram se afastando aos poucos. Uma vez, minha mãe, que não conseguia dormir por causa dos barulhos que eu fazia de madrugada em casa, chegou perto de mim. Mostrei a ela a cidade que eu e muitos amigos virtuais construímos no Active Worlds. Ela me perguntou se ñ estava me afastando do mundo real. Disse que não. Estava certo, não estava me afastando do mundo real. Já tinha me afastado. Vivia em um mundo virtual, dando pouca importância para quem estava ao meu lado de verdade", conta Sérgio, de 23 anos, que ficava na Internet cerca de três horas por dia durante a semana, oito horas aos sábados e mais seis aos domingos.
Sérgio decidiu largar a Rede no início de fevereiro último, quando "aconteceu algo que me fez repensar a vida que estava levando, ou seja, de viciado em Internet". Sua navegação agora se resume a checar o e-mail, esporadicamente, ler o "Minas Gerais" na Rede e a comprar um CD que não encontre nas lojas, mas isso só porque ainda paga o provedor. "Mas em breve abandonarei de vez", ameaça.
Márcia Mello reforça a idéia de que, se não fosse a Internet, seria outra a válvula de escape do viciado. "Qualquer tipo de vício pode ser trabalhado psicologicamente. É um sinal que o indivíduo dá de que algo não está lhe satisfazendo, algo lhe falta e que é preciso completar com o 'vício'".

 

Roberto Cassano surfa desde os tempos em que provedores de acesso eram um sonho distante, mas entre dormir e virar a noite num donwload ele não pensa duas vezes: pula na cama.
 

A Sedução dos Chips
Depoimento de Ana Beatriz, mãe de Marcelo, jovem carioca que deixou a paixão pelos computadores ir longe demais.
"Meu filho é inteligente, gentil. O respeito aos mais velhos sempre fez parte de sua personalidade. Antes, ele era estudioso, trabalhava, praticava esportes e dormia em horários normais, no máximo meia-noite. Nos finais de semana ia a festas, passeava com a noiva, viajava, enfim, fazia tudo o que a maioria dos jovens faz, trocando almoço por lanchonete mas sempre responsável com todos os seus deveres e compromissos.
Um dia percebi que as coisas estavam diferentes. Ele já não agüentava acordar no horário certo para trabalhar. Se conseguia levantar a tempo, corria para o computador e já saía atrasado. Voltava cedo para casa depois da faculdade e corria para o micro. O pior é que, agora, ele chega ao ponto de nem sair para se encontrar com a noiva nos finais de semana. Se ela chega, é recebida com festas, mas logo fica num canto, "trocada" pelo computador.
E o interessante é que não é somente a Internet que o está seduzindo. É todo o universo relacionado aos computadores. Marcelo não fica muito em salas de chat, só no ICQ, onde tem sempre um colega que vai falar da placa nova que instalou, do HD que queimou ou sites novos que visitou. Ele se afastou dos amigos de carne-e-osso, dos amigos de vizinhança que cresceram com ele.
Agora Marcelo dorme às 6h da manhã e acorda somente por volta das 15h. E, por causa do horário, já não sabe se janta, se almoça, se toma o café da manhã, porque, certamente, vai passar a noite no computador. E, quando chegar a hora de dormir novamente, já terão se passado 15 horas seguidas, sem um esforço físico, sem caminhadas, sem fazer o sangue circular, sem alongar a coluna, sem desgrudar do monitor.
Quando os pais reclama, ele diz prontamente que se for pelo pulso do telefone, de meia-noite às cinco da manhã é um pulso só. Mas não é pelo pulso do telefone, é pelo impulso da lógica!
Estou escrevendo para vocês meio que perdida, pensando em quantos jovens estão levando essa mesma vida, que sabemos, mesmo sem entender de medicina, que nada tem de saudável."
* Os personagens deste depoimento estão com pseudônimos. 

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"Refletindo sobre Viciados em Internet e Computadores"
Como saber quando passamos dos limites? 
Márcia Homem de Mello ©

 

Estamos na virada do ano 2000, e o Brasil, perto de completar 500 anos. A vida em modificação constante, muito mais rápido do que podemos acompanhar, talvez rápido demais para alguns ou lento para outros.
Neste momento, nos deparamos com situações novas, mas de comportamentos nem tão novos assim.
Com a chegada do computador e a sua popularização, bem como dos recursos que dele dispomos, começa a invadir nossas vidas, uma quantidade grande de informações, sem que se possa evitar. Bancos, supermercados, lojas, escolas, a segurança de nossas casas e empresas, enfim, fazer uma movimentação bancária, compras, observar notas nas escolas, realizar trabalhos escolares e profissionais, pesquisas, nossa segurança,... Eis aqui alguns dos exemplos de como estamos mais envolvidos com a informática do que se possa pensar.
Neste momento, é chegada a hora de se fazer algumas reflexões sobre estas evoluções. O que isso tem de favorável e até onde pode ser prejudicial? Vamos por partes.
O acesso a Internet, ou aos recursos disponíveis via modem no momento, nos facilita a vida e pode nos possibilitar uma sobra de tempo para podermos realizar outras atividades. Economia de tempo, gera maior produtividade no dia-a-dia de nossas vidas. Só que essa economia de tempo deveria servir para gerar mais tempo para o nosso lazer e descontração, para a família, amigos, namoros, passeios, viagens,... Se sobra mais tempo e as pessoas acabam por procurar mais trabalho, de que adianta nossa economia de tempo? Será que só sobrar tempo para produzir mais trabalho é o caminho indicado? Quando se deixa de ir ao banco para realizar alguma movimentação bancária que o cliente pode fazer de sua casa ou escritório, economizou no mínimo meia hora. O que foi que este cliente, que passou a ser um indivíduo com mais meia hora, fez com essa sua meia hora que ganhou?
Sobreviver sem a Internet é difícil depois que se percebe as inúmeras facilidades de que dispomos com o clique de um mouse. Mas por que deveríamos sobreviver sem ela? Por que não viver e conviver com ela?
A Internet colocou ao alcance de uma grande quantidade de pessoas um mundo virtual, mas que o mesmo é composto de criações de fatos reais ou imaginários, mas se originam de pessoas reais de carne e osso, não de chips e de memória ram, uma vez que a máquina não trabalha sozinha. Como tudo na vida, temos as boas informações e as más informações, temos as boas pessoas e as más pessoas. Faz parte da vida, assim como temos que fazer várias escolhas na vida, agora temos também a Internet para fazermos escolhas, como se escolhe um programa de Tv, um filme no cinema, um papo com um amigo, uma profissão, sempre estamos fazendo avaliações de acordo com o que necessitamos ou desejamos. Na Internet, as informações não tem filtro e chegam na velocidade da luz, ou seja, é só o tempo de alguém apertar alguns botões, algumas letras e pronto, já está tudo ao alcance de todos. 
Por causa desta velocidade, existe uma necessidade veloz de se informar e instruir melhor os usuários deste meio de comunicação. As crianças que não recebem orientação são as mais atingidas pelo volume de informação que podem ser ou não bem interpretadas.
Para quem vê na Rede um ponto de negatividade, provavelmente chegou a ultrapassar o limite do bom senso, e se decepcionou quando não obteve o resultado esperado. Ou então, nem chegou a conhecer os recursos disponíveis por medo, falta de informação, sem perceber, que ao ir ao banco ou ao supermercado, já está fazendo uso dos recursos da informática.
Os recursos de bate-papo, disponíveis em chats, ou programas que possibilitem conversar com pessoas distantes, são muito ricos e úteis quando utilizados de forma adequada, sem prejudicar o andamento diário da vida de cada um. É fascinante poder conhecer pessoas de culturas diferentes, as quais nunca se viu e nem se sabe se será possível ver algum dia. Poder trocar informações, pedir ajuda num trabalho, trocar arquivos, ler, escrever numa linguagem nova e diferente, isso só é possível neste mundo da Rede. É poder matar curiosidade, conhecer um mundo que ultrapassou nossas paredes, nossa cidade, nosso estado, nosso país, nosso mundo inteiro, é conhecer o universo ao "teclar" com uma pessoa, com dez pessoas, com vinte pessoas, com trinta pessoas. Sabe o que é poder estar ao mesmo tempo com trinta pessoas de qualquer parte do mundo conversando ou observando o que se conversa? É ir quase que além da imaginação, é um exercício da agilidade, da fantasia, de emoções, de vocabulários, de criatividade, de pensamentos, da inteligência... É rir, chorar, brigar, xingar, discutir, mentir, falar a verdade,... Poder ser alguém, qualquer alguém.
É isso o que tem fascinado inúmeras pessoas, e fazendo elas ultrapassarem seus próprios limites. Perdendo a noção do certo e errado, do antes e do depois, do ontem e do amanhã. Mas algumas dessas pessoas crescem, amadurecem e aos poucos conseguem perceber o que têm acontecido com elas. Assim como a Rede pode vir a se tornar um vício, como qualquer outro, é necessário se informar. A orientação dos que mais conhecem e entendem deste meio de comunicação é fundamental para os usuários. Aos que não conhecem, cabe o papel de orientar sobre as informações disponíveis no meio, o limite do que é certo ou errado, bom ou ruim. Vai depender de cada usuário, do meio que ele cresceu, da educação, do padrão de vida, da moral, da cultura, da sociedade que vive. A Rede é só mais um recurso disponível ao alcance do Homem e criado por ele. E como tudo no mundo, o uso adequado requer diálogos, esclarecimentos, orientação e vontade de todos.
Usando o depoimento da senhora Ana Beatriz, à Internet Br, o que será que fez com que seu filho Marcelo se voltasse tanto ao mundo dos computadores? Por que será que o mundo de chips, de bites, de modem, de memórias rans, de cameras, de sons, de poesias, de cultura, de pornografia, de ciência, de hackers, de filosofia, da evolução, de perigo,... vêm fascinando mais do que a vida que ele levava antes? Quando algo fascina, se faz qualquer coisa para permanecer assim, é sinal que está agradando, dormir tarde, pagar contas absurdas de telefones, comprar uma linha de telefone, aumentar a velocidade do modem, investir em equipamento, é tudo conseqüência. Por que a vida diária perdeu a graça? Andar, conversar, namorar no virtual nunca será igual a um face-a-face. Então por que permanecer neste mundo diante de um monitor? Será medo? Vergonha? Timidez? Falta de amor próprio? Insegurança? Carência? Solidão? 
Ou será encantamento, necessidade de conhecimento, de realizar feitos inenarráveis, de ultrapassar limites, de provocar reações,... de simplesmente poder comunicar?
Vida saudável? Será que a vida saudável é só fazer exercícios diários, alimentar-se corretamente, tomar sol, ter uma boa noite de sono, não beber, não fumar? Sabemos que não, uma vida saudável requer muito mais do que isso, o Ser Humano precisa de mais coisas para ser saudável. Só que precisa lutar para buscar complemento de sua saúde, física e mental. E para lutar, precisa acima de tudo sentir necessidade, então reflita:

 

Passou dos limites? Que limites? Limites de quem ou de que? O que você tem feito com seus limites? Você tem limites?

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