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Psy_Coterapeuta
A sua terapia online desde 1999
Depoimento de uma leitora dessa página, portadora de TDAH, mãe de um adolescente também com TDAH
Eu tenho um filho de 17 anos que sempre deu muito trabalho, aborrecimento, raiva, desgosto, tristeza a mim e ao pai dele (hoje meu ex-marido). Ele demorou a falar, com 3 anos ainda falava mal, muitas palavras eram distorcidas, por exemplo: a palavra shopping dizia “fóppin”; não tinha medo de nada; parecia que estava ligado em tudo à sua volta; intrometia na conversa alheia; tinha explosões de raiva com chiliques violentos por motivos torpes, que demoravam de 30 a 40 minutos: caía no chão, esgoelava, chorava, e se debatia de forma espetacular; perdia muitos objetos e brinquedos ou não sabia onde estavam; castigos, tapas e repreensões nunca adiantavam; e outros comportamentos um tato estranhos. Mãe de primeira viagem, não tinha muita experiência e acabava acreditando nas pessoas que diziam: crianças são assim mesmo. Na idade escolar apresentou dislexia; erros por pura distração; apresentava respostas antes de ler toda pergunta; errava freqüentemente a matemática; lia o que achava que estava escrito, e não realmente o que estava escrito; não prestava atenção nas aulas, fazia trabalhos escolares na ultima hora, na hora da tarefa, tudo ao redor o distraía, fazendo uma verdadeira guerra de nervos entre eu e ele. Eu também não tinha paciência e acabava gritando com ele e batendo nele, freqüentemente eu tinha um ataque de nervos perante o menino. Sei que o nosso relacionamento foi terrível, eu como mãe achava que era tão doida quanto o filho.
Na adolescência, entrou nas drogas (maconha e bebida); praticava pequenos furtos por adrenalina; repetiu 3 anos na escola; não parava quieto na sala de aula; não parava em casa; não avisava onde estava e sumia 1 ou 2 dias; nunca pensava nas conseqüências dos seus atos; andava com gente de comportamento duvidoso, não conseguia estudar, sempre dormia em cima do livro, tinha acesso de explosão de raiva; quando pegávamos ele para ter uma conversa ele parecia que não estava ouvindo, muitas vezes não estudava para as provas e sempre pensava que dava-se um jeito na hora (cola, enrolar o professor, faltar e dizer que tava doente, etc), não tinha limites nem disciplina, não aceitava uma resposta negativa e outros comportamentos inadequados, o quarto era um caos de bagunça. Aos 12 anos, o pai não agüentava mais e pensava em interná-lo numa escola. Apesar de todos os problemas, ele era e ainda é, muito inteligente.
No mês de julho deste ano, eu estava na Internet pesquisando alguma coisa e notei um site chamado “portal da família” que aborda muitos problemas neste circulo de relacionamento e entrei na janela adolescente e lá vi sobre o TDAH, achei interessante e pesquisei mais a fundo e descobri que a doença era a cara do meu filho. Li bastante sobre o assunto e fui separando os sintomas que cabiam a ele. Eram mais de 30, ou seja todos os sintomas, incluindo a hiperatividade. Levei ao psiquiatra e a médica confirmou as suspeitas. Descobri que além dele, eu, meu irmão e o meu pai também têm a mesma doença. Meu irmão e meu pai moram em São Paulo, mas pela Internet ele contou que ele também tem os sintomas e que sofreu e ainda continua sofrendo muito, e disse que perdeu muito na vida e nunca soube o porque. O mesmo aconteceu com o nosso pai.
O pai do meu filho nunca ajudou muito, só piorava a situação, dizia na cara dele que ele nunca ia dar para nada, que iria puxar carroça, enfim, só rebaixava o menino. Só sabia repreender, xingar e humilhar. Isto foi muito ruim.
Hoje entendo porque a minha vida foi muito caótica, o porque do comportamento do meu filho. Temos TDAH e nunca sabíamos e nunca fomos tratados. Eu deixei de realizar muita coisa na vida, errei muito por falta de pensar, auto-estima baixa, impulsividade, apatia, depressão, adiamento, etc. Perdi muitas coisas na vida por distração, tinha explosão de raiva quando deparava com dificuldade, chegando a agredir colegas de trabalho; perdi empregos, dinheiro, relacionamentos; deixei muitas oportunidades boas passarem.....Hoje me sinto fracassada. Gostaria de me tratar, mas como não tenho condições, priorizo o meu filho. Não gostaria que meu filho tenha uma vida como eu tive. Estou comprando o remédio dele (RitalinaLA) com muito sacrifício porque o pai dele não quer ajudar, alega que não tem condições, mas eu sei que ele pode. O pior é que o medicamento é de uso contínuo, a própria doença faz dele um dependente do remédio. Vou tentar através do governo, porque eu não tenho condições. Ele precisa também de terapia psicológica.
A violência nunca vai acabar porque o governo só pensa em remediar a violência e não as suas causas, as suas origens. Transtornos mentais como o TDAH levam facilmente o indivíduo ao crime pela própria natureza da doença: necessidade de adrenalina, droga, ( a droga é usada como uma auto medicação dos sintomas do tdah), o não pensar nas conseqüências, gosto pelo perigo, a tendência de pensar que sempre dá se um jeito em tudo; noção pobre do perigo; impulsividade, fracasso escolar, etc. Além disso pode causar acidentes de carro por gostar de dirigir em alta velocidade.
A doença não é muito divulgada entre as pessoas, profissionais da educação e médicos. Por isso, deve existir muitas crianças que são punidas e não tratadas (como meu filho foi). O portador deste transtorno é chamado ou apelidado de irresponsável, safado, indisciplinado, baguncento, distraído, no mundo da lua, burro, pouco inteligente, louco e outros nomes que são nada simpáticos.
Gostaria que houvesse divulgação maior para que possa evitar sofrimentos ao portador e sua família, não gostaria que ninguém sofresse por falta de informação. Gostaria também que o Ministério da Saúde voltasse atenção para a doença e ajudasse as pessoas necessitadas com medicamentos e psicólogos competentes para o tratamento do TDAH.
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Obrigada Leitora pelo seu depoimento, mas principalmente pela sua luta e colaboração na divulgação desse Transtorno. Espero poder continuar contando com a colaboração de outros portadores e profissionais interessados em fazer o TDA-H sair do anonimato, mostrar que existem adultos ainda hoje, como vimos nesse relato, convivendo com todos esses sintomas sem saber no mínimo que não são culpados de serem como são, que não foi uma escolha, e sim, uma doença herdada e que existe tratamento.
Márcia Homem de Mello
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