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Contatos virtuais
Por: Fernando Puga - Site Bolsa de Mulher
 

Quando a Internet chegou ao dia-a-dia do brasileiro e revolucionou sua maneira de se comunicar com o mundo, não houve quem não ouvisse falar na história de que os contatos virtuais iriam destruir a vida social em questão de alguns e-mails. Puro alarmismo do apocalipse tecnológico. Quem freqüenta o meio virtual pode, na verdade, encontrar ali grandes chances de expandir seu círculo de amizades e contatos, trocar experiências, fechar negócios, divulgar trabalhos e até arranjar namorado. As comunidades on-line e os softwares de conversa instantânea, abarrotados de gente dividindo assuntos e interesses, encurtaram distâncias e provaram que a revolução foi a favor da proximidade.
Um dos muitos internautas que confirmam essa conclusão é a designer Cristiana Fonda. Seu escritório de trabalho funciona em casa, de onde fica conectada praticamente o dia todo. Entre uma tarefa e outra, Cristiana se vê às voltas com os e-mails das listas de discussão em que se inscreveu. “Conheci muita gente legal. Pelas conversas que rolam entre os participantes, sempre se acha alguém que tem a ver com você. Com alguns, troco e-mails pessoais, com outros, converso pelo chat e já tem aqueles que ultrapassaram o espaço do computador e já estão realmente presentes na minha vida. Fiz amigos de verdade por aqui, tanto real quanto virtualmente”, garante ela, que já conseguiu até trabalho com essa brincadeira. “Participo de uma lista de designers, uma amiga de lá me indicou para um projeto e eu acabei fazendo. Não acredito que a Internet distancie ou esfrie as relações. Na verdade, quem distancia são as empresas aéreas porque estou cheio de amigos pelo Brasil e pelo mundo que eu gostaria de encontrar, mas não posso, ao preço que as passagens estão”, brinca ela, comparando.
Pelo espaço virtual, são infinitos os grupos de pessoas reunidos remotamente em torno de mesmos interesses, dos mais complexos aos mais esdrúxulos. O Orkut, sistema de contatos e comunidades virtuais que virou febre entre os internautas brasileiros nos últimos meses, inaugurou uma nova fase nesse tipo de relacionamento. De grupos pequenos que se juntam para, por exemplo, malhar abertamente um professor ou um estilo de música, a comunidades de mais de onze mil pessoas conversando sobre literatura ou culinária, a participação é intensa aliada a uma estrutura de identificação pessoal. Cada usuário tem uma página própria, constando um resumo sobre si e seus interesses, as comunidades de que participa e seus amigos também inscritos no Orkut. Por ali, a navegação livre abre portas para muitos contatos. “É viciante, muito divertido e me faz conhecer muita gente. Na minha página, tenho misturados amigos reais, de antes, com pessoas que conheci ali. Na verdade, navegando pelas páginas pessoais, fiquei muito animada em perceber como tem gente interessante pelo mundo. Cheguei a ter um rolo com um cara que eu conheci lá, trocamos mensagens, telefonemas e saímos”, revela a atriz Maria Albuquerque, “orkuteira” de carteirinha.
Informação + identificação com os assuntos abordados = público cativo. Soma-se a isso tecnologia, e o resultado é a formação de uma comunidade. Um exemplo disso é o próprio Bolsa de Mulher. Aqui, o Fórum permite que as usuárias se comuniquem para debater temas polêmicos e responder dúvidas umas das outras – afinal, é melhor ter praticamente uma pesquisa do que duas ou três opiniões de amigas que vão com você para o barzinho. “É legal ver que uma matéria gerou comentários e que, a partir deles, outros assuntos vão surgindo, gerando até mesmo novas pautas. As usuárias trocam mensagens, pedem conselhos e nos enchem de orgulho quando demonstram que estão satisfeitas com nosso trabalho”, diz a diretora de conteúdo do site, Luciana Esteves. Dessa forma, a comunidade Bolsa de Mulher vem crescendo e novidades vêm por aí. “Já estamos desenvolvendo novas ferramentas que vão permitir que as usuárias tenham um perfil, até com foto, se elas quiserem, e descubram mais afinidades entre elas. Apostamos que muitas novas amizades surgirão”, revela Luciana.
No entanto, há aqueles que rejeitam esse novo modelo de aproximação. “Uma vez, soube de um cara que resolveu fazer a festa de aniversário dele pela Internet. Você passava numa página, deixava uma mensagem e só. Não consigo acreditar que o cara tenha preferido isso a um abraço de verdade, um beijo. Sem aquela primeira olhada, olho no olho mesmo, sem contato de pele, não consigo sentir me relacionando com ninguém”, afirma a vendedora Rafaela Goulão. Já a professora Patrícia Mendes, que chegou a experimentar os contatos virtuais, garante que não se sente à vontade numa relação pessoal em que há um computador entre os interlocutores. “Fica muito frio, não sei me abrir por ali. No começo, até achei interessante para poder treinar outros idiomas mas, como não há vida em comum, acho muito difícil conseguir sustentar uma relação simplesmente por uma troca de mensagens. Tenho conhecidos virtuais, mas não chego a dizer que tenho amigos de verdade”, teoriza ela.
A psicóloga e psicodramatista Márcia Homem de Mello reconhece o valor dos contatos virtuais como ponto de partida para relacionamentos verdadeiros. “Também acredito que Internet possa ser um elemento de aproximação entre as pessoas, principalmente se usada sadiamente, mesmo porque torna as distâncias físicas mais curtas. Acho que esse tipo de fenômeno se deve à necessidade cada vez maior de vida social aliada ao medo de sair de casa pela violência e ao desejo de privacidade que se tem hoje em dia. O problema é que isso pode funcionar como uma máscara e a realidade não corresponder à virtualidade”, diz ela.
Sobre o risco de ver o computador e a Internet se transformarem em prolongamentos do nosso corpo e vivermos dependentes deles para nos relacionar, Márcia alerta para a questão de transformar a barreira de segurança que eles representam em trincheira contra a aproximação. “O problema está quando só se tem esse tipo de relacionamento, porque o contato real é extremamente necessário para que não se viva num universo fantasioso. E a verdade é que todos nós precisamos mesmo ver o outro, abraçar, pegar, sentir perto, dividir as coisas. Tanto que nós sentimos falta. O ser humano sabe disso”, conclui ela.

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